A obra de arte – seja ela visual, literária, musical –, provoca muitas vezes uma sensação de esvaziamento, de incompletude, de deslocamento para um lugar não identificável, não reconhecível: um não-lugar (tradução livre para ‘utopia’, nome dado por Thomas Morus a uma ilha imaginária, com um sistema sociopolítico ideal. O vocábulo ‘utopia’ é formado com os elementos gregos óu- [do advérbio de negação] e tópos [lugar]). Esse esvaziamento pode ser chamado de ‘dimensão utópica’ e faz com que se procure, em vão, algo para preenchê-lo, completá-lo. Adquirir uma obra de arte traz a sensação ilusória de preenchimento da incompletude por meio da propriedade. Entretanto, ter a propriedade de uma obra de arte não significa ter a posse dela. Vê-la já é, muitas vezes, possuí-la. Estar de posse de uma experiência de arte é reconhecer o em-si da obra. Um em-si que é uma emanação do sujeito que experimenta a obra enquanto permanece em-si. Segundo Adorno, uma frase de Bertold Brecht pode ser considerada o mote propulsor para a utopia: “tem alguma coisa faltando” (NESBIT et al, 2003, p. 327).